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Review por: Jorge Jr.                                                                26/08/2020

Jessica Jones

#1 AFASTADA

 

Os criadores de Alias estão de volta agora em Jessica Jones, o gibi mudou de título por conta da série de TV, mas também porque Alias parecia uma tentativa de dar um “codinome” de super-herói e quem conhece a personalidade da Jessica sabe que manter esse nome não seria justo, ela detesta ser lembrada que já fez parte do clubinho dos fantasiados e evita qualquer referência ao gênero, suas roupas são sempre bem folgadas e monocromáticas para antagonizar com os super-heróis e seus colantes apertados e coloridos. Qualquer pessoa que questionada se gostaria de ter o poder de voar, provavelmente responderia que sim, Jessica Jones tem o poder de voar e não voa, ela diz que seria porque nunca aprendera a pousar, “-Humanos não foram feitos para voar, é por isso que eles não voam!”, mas acredito que seja para evitar o estereótipo, ela raramente voa em situações “super-heróicas”, mas se for para evitar uma situação constrangedora em sua vida pessoal ela salta para o alto e avante.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Brian Michael Bendis criara uma personagem com uma personalidade complexa e contraditória que luta contra a sua natureza mesmo tendo consciência de seu propósito.

 

Nesse primeiro encadernado vemos Jessica sair da cadeia e não somos informados porque ela estava presa e em algum momento perdido na vastidão que são as cronologias dos quadrinhos, entre Alias e Jessica Jones, ela casa-se com Luke Cage e eles têm uma filha e por algum motivo, durante o tempo que ficou na cadeia ela esconde sua filha de Luke causando uma crise entre o casal. Mas Jessica continua atuando em seu escritório cliché de detetive particular com persianas e o nome na porta, não é o nome dela como o do Ed Mort e sim “Codinome serviços investigativos”, até o nome da antiga série fora traduzido. Percebia em Alias algo que lembrava Marvels de Busiek, uma perspectiva diferente da visão sobre os super-heróis e suas ações, em particular seus efeitos colaterais no mundo dos meros mortais e a nova cliente de Jessica traz um caso exatamente nesses moldes, seu marido alegava ser de um universo paralelo, sua conversa é momentaneamente interrompida por super-heróis que passam ao fundo para combater algum possível super-vilão (mais uma referência à Marvels), mas nerds compulsivos que ainda acompanham as sagas caça níqueis da Marvel, perceberão que provavelmente o que aconteceu com ele foram reflexos dos eventos ocorridos na saga Guerras Secreta (a mais nova), onde todos os universos paralelos da Marvel foram destruídos, uma cópia barata de Crise nas Infinitas Terras. Bendis amarra muito bem o roteiro e cria mistérios durante a trama, não saber desses pormenores não atrapalha em nada o entendimento da história.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jessica é sequestrada e convidada a fazer parte de um grupo terrorista que tem como objetivo eliminar super-heróis, sua líder pensa que Jessica nutre o mesmo ódio pelos fantasiados e sua arrogância, “-Vestir a bandeira e se dizer América, decidir o que é certo ou errado para todo o resto, achar que sabe mais do que todo o resto e sem responder a ninguém” o interessante é que provavelmente Jessica concorda com alguns argumentos da terrorista. Durante o sequestro Jessica fica desacordada e sonha com sua filha já adulta vestida de Capitã América, seria um pesadelo ver sua filha herdar a sina que a mãe tanto tentou evitar ou seria um sonho a filha trajar o manto do herói que ela mais admira? Logo nos é revelado que a prisão de Jessica era uma isca para o convite dos terroristas a pedido de sua amiga Carol Denvers, a arrogância super-heróica em pessoa.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Desconfio que parte dessa repulsa que Jessica sente em ser super-herói ou participar de um grupo deles seja pelo seu desejo de ter uma vida normal (como se alguém tivesse uma) e nada é mais normal que constituir família, ela sempre tenta esconder seus superpoderes, mas se esquece que não são os poderes que fazem um herói, é o sacrifício, ela arrisca seu casamento e o sonho de uma vida feliz e normal para participar de uma missão entre os fantasiados. São decisões que ela duvida serem corretas, mas que se sente no dever de toma-las.

Na arte, Michael Gaydos continua criado um vocabulário incomensurável de expressões faciais, são complementos dos diálogos, realmente funcionam como palavras. Seu traço está mais definido e as diagramações estão muito mais tradicionais se comparadas as de Alias.

 

#2 OS SEGREDOS DE MARIA HILL

 

No segundo encadernado a trama tem um plot de espionagem, a narrativa em primeira pessoa é mais utilizada, marca registrada das histórias de Jessica Jones e de todas as histórias de detetive particular noir, sua cliente dessa vez é a ex-chefe da Shield, Maria Hill, ela quer descobrir quem quer mata-la. Hill está diante dela sangrando e pedindo ajuda, Jessica sabe que espiões são mentirosos profissionais, sabe que é quase certo que ela será usada, sabe que não deve acreditar em nada que Hill diz, mas contrariando sua própria consciência (que no caso dos quadrinhos são aqueles balões quadrados de pensamentos) ela aceita ajuda-la.

 

Jessica se reconcilia com Luke, os diálogos de Bendis criam romantismo com bom humor e personalidade sem a pieguice natural em romances do gênero.

 

Sharon Carter, subchefe da Shield prende Jessica para força-la a contar onde está Maria Hill. Na que já se torna uma situação clássica de Jessica (não só dela), ela se encontra em suas reflexões enquanto se alivia no banheiro. Os leitores de Jessica Jones gostam dela, não porque ela é a mais poderosa da Marvel, não pelo seu uniforme grunge, os leitores gostam de Jessica pelas suas imperfeições, pela sua humanidade, pelo seu realismo (na medida do possível), quem não faz suas reflexões enquanto também suas necessidades, quem não xinga, quem não duvida da qualidade de suas escolhas? Um pensamento resume seu dilema corriqueiro: “-Devia tá em casa no chamego com minha pequena, mas também quero um mundo melhor que este antes que ela se dê conta dele”, mas independente das decisões que tome, ela sempre se sente culpada.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“Nenhuma boa ação fica sem punição”, para ninguém esse ditado faz mais sentido do que para Jessica Jones, na busca de resolver o caso de Hill, ela sempre procura fazer o correto e por esse mesmo motivo ela sempre se ferra. O desenrolar do caso tem um plot twist inesperado e uma motivação forçada, mas interessante.

 

 

#3 O RETORNO DO HOMEM PÚRPURA

 

Jessica Jones é uma super-heroína com duas origens, a primeira foi quando ela conseguiu seus superpoderes depois que sua família morreu num acidente de carro e ela foi contaminada por agentes radioativos e se tornou a super-heroína chamada Safira. Mas essa primeira origem é só um pretexto para contextualizar a Jessica no universo dos fantasiados. A segunda é a transformação de Safira em Jessica Jones (a nossa) e o responsável por essa transformação é o Homem-Púrpura, Killgrave, esse terceiro encadernado trata do seu retorno.

Ética é a consciência de que temos de agir de certa forma para a melhor convivência em sociedade, é contermos apetites para conservar um patrimônio coletivo, mas e se você pudesse fazer qualquer pessoa dizer ou fazer o que você quisesse, qual seria a função da ética para você? No passado, durante oito meses Killgrave controlou a vontade de Jessica Jones, ele controlava tudo o que Jessica pensava, sentia e fazia, se ele quisesse, ela nem saberia que estava sendo controlada, teria certeza que eram sentimentos e decisões genuínas, esse é o poder do Homem-púrpura e ele não tem valores morais, ele não precisa deles. Nosso comportamento é moldado pelas relações e regras sociais e a vergonha é consequência de uma ruptura desses padrões de comportamento, Killgrave não pode ser atingido por essas regras, ele seria incapaz de ruborizar, talvez por isso ele seja roxo e sempre pareça estar feliz, afinal ele não precisa lidar com dilemas. Jessica Jones é o exato oposto, a angústia que ela sente é consequência de sua liberdade e das escolhas que ela decidiu tomar diante de cada dilema, a angústia se origina da necessidade de atribuir valor a cada escolha que faz e são esses valores e princípios que formam o caráter de Jessica.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Bendis utilizou o Homem-púrpura como uma metáfora para relacionamentos abusivos, mas ele significa um pouco mais, ele é seu arqui-inimigo, seu antagonista e seu criador, segundo o próprio Killgrave ela ainda estaria fantasiada e sem importância, sua intervenção teria tornado a vida de Jessica mais interessante, ele se pergunta se não seria um deus. Como um gênio da lâmpada, ele decide lhe conceder três desejos, Jessica poderia acabar com as guerras, com a fome, controlar líderes mundiais, o que Jessica mudaria para tornar o mundo melhor? Ela percebe que não pode, não deve aceitar, ela sabe que ética não é um conjunto de ações prontas, não é autoajuda, não é o politicamente correto, não é um código de conduta, se fosse, seríamos todos escravizados sem liberdade de escolha, se ela aceitasse seria como ele ou como todo ditador bem intencionado. Esse terceiro encadernado é sem dúvida o melhor dos três, os diálogos de Bendis são coloquiais, mas cheios de conteúdo. Particularmente achei o desfecho da trama bem decepcionante, mas o seu caminho foi excepcional.

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Marvels e Alias #22.

Alias #7 e Jessica Jones #9.

Alias #23 e Jessica Jones #16

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